Terça-feira, 5 de Fevereiro de 2013

[casa sem mãe é um deserto] a metáfora

Amor de paiImagem de aqui

 

Depois de postar o provérbio africano ali abaixo, que diz que sem mãe, qualquer lar é um deserto, fiz o caminho de volta do mato até Lisboa e calculem que só então me apercebi que esse provérbio, para ser verdadeiro, aqui não pode passar de uma metáfora. Onde se lê "mãe" tem de se ler "carinho", nada mais. Aliás, na semana passada estive num encontro de adoção com pessoas que adotaram crianças há menos de seis meses e conheci dois homens solteiros (ou divorciados, ou coisa que o valha, que isso não me interessa, as minhas amigas que não se ponham já a sorrir com cara de caso) que se meteram na aventura de adotar uma criança sozinhos. A casa deles não tem mãe mas, pelo que me contaram, é um oasis que os meninos encontraram no seu deserto emocional.

Um deles, o F., falou-me de peripécias absolutamente desconcertantes, ainda muito recentes, com o filho de cinco anos, que lhe perguntou, da primeira vez que foram ao supermercado, como se chamava a senhora da caixa. Ele, um pouco encavacado por a senhora os estar a ouvir, respondeu que não sabia, que não a conhecia. "Então porque estás a brincar com ela ao Monopólio?" E foi então que o F. percebeu que ele nunca tinha visto dinheiro ao vivo e pensava que as notas e moedas eram peças de brincar. Tal como rapidamente se apercebeu de que o filho nunca tinha visto alimentos crus, salvo banana e laranja, e pensava que os alimentos que ele tinha na cozinha eram brinquedos como aqueles com que as "meninas pirosas" brincavam às cozinhas no lar onde vivera.

Contou-me que o filho o chamou de hora em hora durante a noite nos primeiros quinze dias, até lhe explicar que não podia chamar tantas vezes porque os dois precisavam de dormir. A cara de espanto do menino foi inacreditável: "Mas os crescidos não dormem! Lá na outra casa eu chamava sempre e as educadoras vinham. Estavam sempre vestidas e a conversar." E o F. lá lhe explicou que todos os adultos dormem e que o pai, especialmente, precisava de dormir bem para ficar bem disposto. Depois explicou-lhe o que fazer em todas as situações para as quais ele o tinha chamado noites a fio: frio, calor, vontade de ir à casa de banho, sede, etc. Ele não se sabia tapar sequer...

Contou-nos ainda que um dia o menino o viu a arrumar comida no frigorífico e aproximou-se pé ante pé. Segredou-lhe então baixinho, pregando-lhe um susto: "O que é que estás a esconder?"

É absolutamente maravilhoso imaginar o menino que lhe chegou a casa há cinco meses e a explosão de desenvolvimento que se deve ter seguido para chegar a ser o menino bem adaptado, simpático e desenvolto que é hoje. Em cinco meses! Portanto bem se vê: para dar vida a um deserto não é preciso uma mãe, é preciso haver quem ame e se interesse.
Retirado de Beijo de mulata
publicado por Jorge Soares às 14:08
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11 comentários:
De Susana a 9 de Fevereiro de 2013 às 00:13
Olá Jorge
queria dar-lhe os parabéns pelo blog. Temos 2 filhos e pensamos daqui a uns anos vir a adoptar uma criança também, assim as nossas economias nos permitam ter mais uma criança.

Gostaria de saber o que acha da vinda para casa de uma criança adoptada quando em casa já existem 2 filhos do casal (estamos a pensar neste caso adoptar uma menina). Acha que devemos ter alguma atenção especial? Para nós não tem de ser um bebé, no máximo até aos 5 anos. Gostava de saber a sua opinião ou de algum site que nos recomende ou leitura sobre este assunto.
Obrigado mais uma vez pelo seu blog.
Cumprimentos e felicidades
Susana
De Jorge Soares a 20 de Fevereiro de 2013 às 22:06
Olá Susana

Cá em casa já havia duas crianças quando chegou a terceira que foi adoptada, se têm condições económicas e sociais para ter um terceiro filho e se tem vontade de adoptar é claro que podem e o devem fazer.

Quanto ao que podem ter atenção... a segurança social por principio é contra a entrada de crianças mais velhas, quando se candidatarem de certeza que vão insistir que seja mais nova que os vossos filhos..
De resto, cada criança é uma criança e cada caso é um caso, o único que posso aconselhar é que se encham de paciência que a espera nunca é fácil.

Sobre leituras... aconselho este blog.. para além dos requisitos legais não há muito mais na internet.

Jorge

De Susana a 20 de Fevereiro de 2013 às 23:09
Obrigado Jorge,
Neste caso temos dois rapazes de 4 anos e 2 mesinhos. A adopção só aconteceria daqui a uns aninhos. Sei de pessoas que trabalham em instituições em regime de voluntariado com crianças e depois decidem adoptar alguma com quem trabalham, outras cuja familia serve de acolhimento e depois adoptam a criança. Isso é possível de se fazer? ou seja, depois de comhecerem a criança entrarem com os papeis de adopçao para uma criança em particular?
De Jorge Soares a 20 de Fevereiro de 2013 às 23:15
Por lei as famílias de acolhimento não podem adoptar.

O que acontece muitas vezes, eu conheço casos desses, é que para as crianças para as que não há candidatos, normalmente crianças mais velhas ou com doenças, há pessoas que se tornam famílias amigas, não confundir com família de acolhimento, e por vezes após estabelecerem uma relação com a criança, candidatam-se para a adoptarem

Nestes casos a segurança social faz uma avaliação mais sumária e após aprovação dos candidatos estes adoptam aquela criança.

Mas atenção, isto só acontece para as crianças para as que comprovadamente não há candidatos.

Jorge

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